quarta-feira, junho 29, 2011

Uma vez, uma vez mesmo, só uma vez...

Estávamos acampados em uma praia deserta, em um vilarejo situado entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Fomos comer alguma coisa na pequena cidade. Estendemo-nos nas conversas, no tempo que nos abarcava lentamente, nos risos e bebidas. Ao voltar para nossas barracas nos deparamos com a maré que havia subido e ocupado uma passagem entre a areia e uma grande rocha. Tivemos que seguir com a água na altura da cintura contornando a grande pedra sob a escuridão da noite e com medos retirados das profundezas das nossas mentes. Até que meu amigo Mario, que seguia à frente de todos, gritou assustado pulando da água. O susto do instante nos me fez lembrar a morte. Imediatamente todos nós, estávamos em quatro, gritamos e ao olharmos para a água do mar, um grande susto: ela brilhava muito. Principalmente próximo aos nossos corpos. Agitados pela ignorância e o medo chegamos até a beira da praia e vimos que as ondas ao quebrar emitiam luz. Luz! A magia do brilho nos aquietou as vozes e nos fez aproximar novamente da água. Era uma luz verde fluorescente. Então um de nós, já não me lembro quem, gritou: é planctôn luminescente! É plâncton! Ficamos tão felizes que pulamos na água maravilhados, e a cada golpe da nossa pele na água era uma explosão de luz. Ríamos novamente sem compreendermos muito bem aquilo. Gritávamos uma felicidade que não era nossa. Envolto aos nossos corpos o plâncton criava uma aura. Não tínhamos nenhuma máquina fotográfica naquele momento. E viver aquilo foi ficando difícil, pois era bonito demais só para nós quatro. Queríamos ter a certeza de que aquele pedaço de mar luminescente pudesse existir para qualquer pessoa. Aos poucos a intensidade daquelas micro luzes foram diminuindo e a novidade também. Não sabíamos o que fazer com aquilo. Aproximaram algumas pessoas assustadas pelos nossos gritos pensando que alguém pudesse estar se afogando. Mas quando elas chegaram a luz dos plânctons estava praticamente imperceptível. E nós, salvos em terra firma, não sabíamos nem explicar o que acontecera. Parecia ridículo falar que nós tínhamos nadado em um mar luminescente, que existiam micro seres marinhos que brilhavam muito, como uma legião de vaga-lumes aquáticos. Ficamos sem jeito. Continuamos andando em direção ao camping em silêncio. Cada um devia estar confabulando ideias. Depois de ter tomado banho, lembro que não consegui dormir. Voltei à praia. Fiquei conversando com Mario. Acho até que ficamos mais tempo em silêncio observando a imensidão sem fim que fazia a união do céu e do mar, do que falando. Até que em meio a uma brisa passou voando um vaga-lume, apenas um. Corremos e pegamos o inseto. Mario, que é biólogo, disse alguma coisa sobre aquela luz vinda do abdome dos vaga-lumes. Só então comentamos sobre o ocorrido, sobre o êxtase de termos nadado no mar de luzes produzidas por aqueles seres marinhos. Ficamos impressionados com aqueles encontros luminosos seguidos um do outro.
Tempos depois pensei: podia ter sido um vazamento radioativo e mesmo assim lá estaríamos, felizes e brincalhões.
Mas não, aquilo foi a verdade.
Um mar de verdade.
Ali, naquele tempo eu estive.

domingo, junho 26, 2011

uma carpa gorda
flutuante
que rompe a água turva do lago
deslidançando seu corpo a rir de quem a


homens à procura de cargas tombadas
dos acidentes mortais
nas vias

estão todos suspensos
nas filas dos caixas a

transpor o ar com dificuldade

enquanto erguem-se da terra
seus ossos em erpuções
concretas, como o riso da carpa

ou a fome do homem

ou a ilusão nas filas

ou a carreta morta.

sábado, junho 18, 2011

Olho uma montanha,
O que vejo:
Ossos erguidos da terra.
Olho uma mãe:
O que vejo:
Ossos erguidos da terra.
Olho o céu,
O que vejo:
O oco do osso universal.

Vejo pelo buraco ósseo,
Cavidades circulares,
Rodopios de vento,
Dobras seculares,
Tigelas de ar,
Sonhos.

segunda-feira, junho 06, 2011

quando o cordão umbilical...
é o primeiro rio da criança,
quando a mãe mija no parto...
é a primeira corredeira da criança,
quando o peito da mãe...
é a primeira cachoeira da criança,

depois, quando a vida...
é o sereno,
é a brisa,
é o vento,
é a chuva fina,
...
as pancadas,
os granizos,
a pedra,
o ferro,

aprisionada, a criança.
Ai,
que saudade de um vagalume!

domingo, junho 05, 2011

Eis que abre caminhos a flor do tempo
Expande, aprofunda na carne
Toma minhas costas
Abraça-me.