sábado, dezembro 17, 2011

As flores debruçadas sobre
o parapeito da janela
anunciam a tristeza dos
lares artificiais e seus
potes
de maionese.

sexta-feira, novembro 18, 2011

Entre os dedos passam
segundos entre os
livros da estante passam
séculos entre os telefonemas
anos que não nos
falamos, de sentimentos tão
universais milenares
entre, por favor, passam
horas e não te reconheço.

terça-feira, novembro 08, 2011

Envelhecem os móveis.

A madeira se preocupa
com os cupins enquanto
estes tornam-se o inconsciente
memorial de piqui niques
juras de amor à canivetes
ceras lacrimais que só soube
a árvore, outros jamais.

Observa-me um móvel.

Todos os dias limpo pequenos
grãos que expulsa
o móvel inconsciente à beira
da janela de onde vejo
de retruque aquele que
não me sai da cabeça.

Sinto a cada segundo que
sou sugado e criado pelo
pensar do móvel e que
como o cupim, tenho
amor à madeira e, imóvel,
do outro lado, envelheço
como se aguardasse a
queda do móvel ou ele

a minha.

segunda-feira, setembro 26, 2011

Ei homem, é a ti que te fala,
Te diz, tua própria voz.

Vistes o quê? O tempo.
Sim, e jamais pôde tê-lo
Apontado.

Deite a ti; mudo, cala-te
À espera do Eu, de Eus,
De deus.

Volta homem!, que tomado de assusto
Sumiu frente aos meus olhos.

quarta-feira, setembro 07, 2011

sábado, setembro 03, 2011

Ergo com pesada dificuldade
a cabeça adentrada e

Eles me sorriem.

A cama é a desavença da mesa,
o que opõe suas similaridades.
Observo a desavença do
meu pensamento.

Eles sorriem.

As árvores se agrupam ao longo
dos anos que passaram para onde?

Meus dedos pensam que a copa das árvores
são as raízes do centro da terra e
que o perfume das flores é a putrefação
do magma de deus.

Eles sorriem com as bocas prenhes
de voz mesclada à comida salivada
babando um texto antigo, quase esquecido.
Apontam com os dedos tortos a fonte,
indicam os jardins, as minhas roupas,
o céu e a poeira odiosa dos livros.

Eu tapo os ouvidos inutilmente porque
suas vozes saltam além do buraco das bocas.
Ergo meus braços enquanto despenca
minha cabeça como se forçasse sobre ela
o peso das sementes.

quarta-feira, junho 29, 2011

Uma vez, uma vez mesmo, só uma vez...

Estávamos acampados em uma praia deserta, em um vilarejo situado entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo. Fomos comer alguma coisa na pequena cidade. Estendemo-nos nas conversas, no tempo que nos abarcava lentamente, nos risos e bebidas. Ao voltar para nossas barracas nos deparamos com a maré que havia subido e ocupado uma passagem entre a areia e uma grande rocha. Tivemos que seguir com a água na altura da cintura contornando a grande pedra sob a escuridão da noite e com medos retirados das profundezas das nossas mentes. Até que meu amigo Mario, que seguia à frente de todos, gritou assustado pulando da água. O susto do instante nos me fez lembrar a morte. Imediatamente todos nós, estávamos em quatro, gritamos e ao olharmos para a água do mar, um grande susto: ela brilhava muito. Principalmente próximo aos nossos corpos. Agitados pela ignorância e o medo chegamos até a beira da praia e vimos que as ondas ao quebrar emitiam luz. Luz! A magia do brilho nos aquietou as vozes e nos fez aproximar novamente da água. Era uma luz verde fluorescente. Então um de nós, já não me lembro quem, gritou: é planctôn luminescente! É plâncton! Ficamos tão felizes que pulamos na água maravilhados, e a cada golpe da nossa pele na água era uma explosão de luz. Ríamos novamente sem compreendermos muito bem aquilo. Gritávamos uma felicidade que não era nossa. Envolto aos nossos corpos o plâncton criava uma aura. Não tínhamos nenhuma máquina fotográfica naquele momento. E viver aquilo foi ficando difícil, pois era bonito demais só para nós quatro. Queríamos ter a certeza de que aquele pedaço de mar luminescente pudesse existir para qualquer pessoa. Aos poucos a intensidade daquelas micro luzes foram diminuindo e a novidade também. Não sabíamos o que fazer com aquilo. Aproximaram algumas pessoas assustadas pelos nossos gritos pensando que alguém pudesse estar se afogando. Mas quando elas chegaram a luz dos plânctons estava praticamente imperceptível. E nós, salvos em terra firma, não sabíamos nem explicar o que acontecera. Parecia ridículo falar que nós tínhamos nadado em um mar luminescente, que existiam micro seres marinhos que brilhavam muito, como uma legião de vaga-lumes aquáticos. Ficamos sem jeito. Continuamos andando em direção ao camping em silêncio. Cada um devia estar confabulando ideias. Depois de ter tomado banho, lembro que não consegui dormir. Voltei à praia. Fiquei conversando com Mario. Acho até que ficamos mais tempo em silêncio observando a imensidão sem fim que fazia a união do céu e do mar, do que falando. Até que em meio a uma brisa passou voando um vaga-lume, apenas um. Corremos e pegamos o inseto. Mario, que é biólogo, disse alguma coisa sobre aquela luz vinda do abdome dos vaga-lumes. Só então comentamos sobre o ocorrido, sobre o êxtase de termos nadado no mar de luzes produzidas por aqueles seres marinhos. Ficamos impressionados com aqueles encontros luminosos seguidos um do outro.
Tempos depois pensei: podia ter sido um vazamento radioativo e mesmo assim lá estaríamos, felizes e brincalhões.
Mas não, aquilo foi a verdade.
Um mar de verdade.
Ali, naquele tempo eu estive.

domingo, junho 26, 2011

uma carpa gorda
flutuante
que rompe a água turva do lago
deslidançando seu corpo a rir de quem a


homens à procura de cargas tombadas
dos acidentes mortais
nas vias

estão todos suspensos
nas filas dos caixas a

transpor o ar com dificuldade

enquanto erguem-se da terra
seus ossos em erpuções
concretas, como o riso da carpa

ou a fome do homem

ou a ilusão nas filas

ou a carreta morta.

sábado, junho 18, 2011

Olho uma montanha,
O que vejo:
Ossos erguidos da terra.
Olho uma mãe:
O que vejo:
Ossos erguidos da terra.
Olho o céu,
O que vejo:
O oco do osso universal.

Vejo pelo buraco ósseo,
Cavidades circulares,
Rodopios de vento,
Dobras seculares,
Tigelas de ar,
Sonhos.

segunda-feira, junho 06, 2011

quando o cordão umbilical...
é o primeiro rio da criança,
quando a mãe mija no parto...
é a primeira corredeira da criança,
quando o peito da mãe...
é a primeira cachoeira da criança,

depois, quando a vida...
é o sereno,
é a brisa,
é o vento,
é a chuva fina,
...
as pancadas,
os granizos,
a pedra,
o ferro,

aprisionada, a criança.
Ai,
que saudade de um vagalume!

domingo, junho 05, 2011

Eis que abre caminhos a flor do tempo
Expande, aprofunda na carne
Toma minhas costas
Abraça-me.

segunda-feira, maio 30, 2011

Ontem, no futuro, eu pensaria que amanhã já não serei
Mar é essência e superfície
Mar é consistência
Tempo é deslocamento de espaço
Tempo é inconsistência

sábado, maio 28, 2011

Habito o mecanismo da cidade
Antes, porém, manuseio o meu próprio,
O da linguagem, dos olhares, do toque, da respiração,
Aqueles inomináveis, manejo.

Manuseio também o outro, a mim
Na ilusão de seguir a linha reta do tempo.

No difícil ritual de estar, antes mesmo de ser,
Fora mesmo da linguagem, na carne que respira,
Na ficção primeira, onde supõe-se que o real
É apenas uma canoa que transpõe as margens.

sexta-feira, maio 27, 2011

A ti, inevitável, com o carinho que se deve ter.
Todos os encontros foram, na bem da verdade,
Um ritual à morte.

segunda-feira, maio 16, 2011

Pensa a pedra

ali está a pedra
tranquila

meditando sobre
sua própria morte

pesando sobre si
seu próprio castigo
porém serena

e eterna.

Pela pedra
vejo que pensa
a pedra.

Penso eu

frente a pedra
só me resta a festa e o choro.

segunda-feira, maio 02, 2011

Todo povo tem sua guerra
Todos corpo tem sua terra
Toda guerra tem seu povo
Toda terra me há de ver de novo

sexta-feira, abril 29, 2011

vida

somos uma sequência enlouquecida de outrens.
é preciso recuperar as memórias de cada partícula, cada elemento químico que nos compõe.
a outra memória cristaliza-se na alma? é preciso criá-la.

o que já sonharam meus ossos?
se minha cabeça extremesse com todo o esquecimento,

é preciso que ela exploda,
tomar o esquecimento como memória buraco e assossegar,
assos segar
a sós cegar.

quem foram, milhares de outros seres, alguns sonhadores, as partes que me revestem?

esse jogo é interessantíssimo e
devastador,
de vasta dor.

sexta-feira, março 04, 2011

minhas mãos bem fechadas
fermenta ali um pensamento
pingam sementes
enquanto mofam umidecências
nas dobras.

segunda-feira, janeiro 31, 2011

Nos teus sonhos


Foi que você deu conta do tempo.

Da irrealidade das matérias, da presenças, dos passados.
E agora, meu filho, me vem perguntar dos seus
pátios internos, ques pátios? Já não há mais.



Essa loucura dos olhares infantis.
Onde se esconde os pátios pueris das minhas avós?
Como aquelas mulheres tão férteis vivem, mãe?
Ques sentimentos brotam em pensar que se viveu tanto?
Quanta marca, quanta memória e lembranças enfraquecidas dos abraços
dos abraços das suas mães, dos gritos... essas pegadas sujas pela casa da alma...
Eu sei que elas enloqueceram... eu sinto o pavor no sabor da comida.
Fitas de couve entre os dedos tortos, entortados pelo tempo.




Essas dores não são suas, meu filho
Então por que nas noites, quando me adentra a maravilha dos sonhos
É numa corredeira turbulenta de leite grosso, gorduroso, que caio
E sou dragado, como o mundo puxa o filho da irrealidade da barriga
Materna? Se não é minha, que líquido branco é aquele que me lava com a força
Das colisões galáxicas? Se não é nossa, como me explica guardarmos em funcionamento e
Tanto zelo
O relógio bicentenário da família. Somos devotos do tempo
Como as cascas das árvores são as preocupações das unhas de um gato.

Essas dores não são suas, meu filho
Calma, que o tempo se encarregará
em carregará
carregará
cá regará
nessa lisidão dos seus cabelos
como se chora sobre um peixe
como chora o peixe até encher o mar
como chora o mar de peixe
das tuas mãos forçando um filete de carvão nos lábios roxosos
Essas dores não são suas, meu filho,
São dores

De todos nós.

sábado, janeiro 22, 2011

Eu vi as folhas da sua árvore caindo,
os traços se abrindo no teu couro e mente.
Você, sem saber, fazia o papel do guia
de um trem fantasma maravilhoso,
que não parecia ter fim na minha angústia,
o seu corpo rijo em meus braços tentando
conter seus vômitos e seu grito que era o
sentindo da vida vazando pelo ar seco dos
meus sonhos. O meu caminho da escrita se dava
ali, na confusão das realidades que tanto
me assustaram e me fizeram acordar
com medo, temor e amor a ti, pai.

quarta-feira, janeiro 12, 2011

uma vez eu fui dormir, como todos os outros dias,
e sonhei, deitei nos lençóis macios
do berço das minhas ilusões
e nunca mais parei de sonhar

desconfio de que tenha morrido
é isso a morte?

domingo, janeiro 09, 2011

a ficção entre a tesoura e
meus olhos impede que eu ande

o carinho fino pelas mãos da Angústia
é meu refúgio na cicatriz da noite

o peito estriado [da mãe] me força
a escolher um caminho do rasgo na pele

tiro da boca uma lesma cascuda que não se dissolve
nunca se dissolverá
tiro dos braços, das fendas do corpo
tiro da mão feroz
tiro do prato a cartilagem da sobra

tiro você
ah, tiro você
há tiro, você

voam muitos insetos
um deles quem mata
é você
que mato

"as ficções", comentaram rindo, em zomba


por que estas costas infinita?
para que eu caia sem fim cortando
o ar com essas
tesouras desafio

por isso
há ficção entre meus olhos e a lâmina
e você ainda me vem falar de realidade!
Eu me desejei
Eu me desertei