segunda-feira, janeiro 31, 2011

Nos teus sonhos


Foi que você deu conta do tempo.

Da irrealidade das matérias, da presenças, dos passados.
E agora, meu filho, me vem perguntar dos seus
pátios internos, ques pátios? Já não há mais.



Essa loucura dos olhares infantis.
Onde se esconde os pátios pueris das minhas avós?
Como aquelas mulheres tão férteis vivem, mãe?
Ques sentimentos brotam em pensar que se viveu tanto?
Quanta marca, quanta memória e lembranças enfraquecidas dos abraços
dos abraços das suas mães, dos gritos... essas pegadas sujas pela casa da alma...
Eu sei que elas enloqueceram... eu sinto o pavor no sabor da comida.
Fitas de couve entre os dedos tortos, entortados pelo tempo.




Essas dores não são suas, meu filho
Então por que nas noites, quando me adentra a maravilha dos sonhos
É numa corredeira turbulenta de leite grosso, gorduroso, que caio
E sou dragado, como o mundo puxa o filho da irrealidade da barriga
Materna? Se não é minha, que líquido branco é aquele que me lava com a força
Das colisões galáxicas? Se não é nossa, como me explica guardarmos em funcionamento e
Tanto zelo
O relógio bicentenário da família. Somos devotos do tempo
Como as cascas das árvores são as preocupações das unhas de um gato.

Essas dores não são suas, meu filho
Calma, que o tempo se encarregará
em carregará
carregará
cá regará
nessa lisidão dos seus cabelos
como se chora sobre um peixe
como chora o peixe até encher o mar
como chora o mar de peixe
das tuas mãos forçando um filete de carvão nos lábios roxosos
Essas dores não são suas, meu filho,
São dores

De todos nós.

sábado, janeiro 22, 2011

Eu vi as folhas da sua árvore caindo,
os traços se abrindo no teu couro e mente.
Você, sem saber, fazia o papel do guia
de um trem fantasma maravilhoso,
que não parecia ter fim na minha angústia,
o seu corpo rijo em meus braços tentando
conter seus vômitos e seu grito que era o
sentindo da vida vazando pelo ar seco dos
meus sonhos. O meu caminho da escrita se dava
ali, na confusão das realidades que tanto
me assustaram e me fizeram acordar
com medo, temor e amor a ti, pai.

quarta-feira, janeiro 12, 2011

uma vez eu fui dormir, como todos os outros dias,
e sonhei, deitei nos lençóis macios
do berço das minhas ilusões
e nunca mais parei de sonhar

desconfio de que tenha morrido
é isso a morte?

domingo, janeiro 09, 2011

a ficção entre a tesoura e
meus olhos impede que eu ande

o carinho fino pelas mãos da Angústia
é meu refúgio na cicatriz da noite

o peito estriado [da mãe] me força
a escolher um caminho do rasgo na pele

tiro da boca uma lesma cascuda que não se dissolve
nunca se dissolverá
tiro dos braços, das fendas do corpo
tiro da mão feroz
tiro do prato a cartilagem da sobra

tiro você
ah, tiro você
há tiro, você

voam muitos insetos
um deles quem mata
é você
que mato

"as ficções", comentaram rindo, em zomba


por que estas costas infinita?
para que eu caia sem fim cortando
o ar com essas
tesouras desafio

por isso
há ficção entre meus olhos e a lâmina
e você ainda me vem falar de realidade!
Eu me desejei
Eu me desertei